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CAMINHO SEM VOLTA - A HISTÓRIA DOS NOVOS BAIANOS E OUTROS VERSOS


Livro: A HISTÓRIA DOS NOVOS BAIANOS E OUTROS VERSOS
Autor: Moraes Moreira

Editora: Lingua Geral




O GLOBO, SEGUNDO CADERNO, 03/12/2007

Que a música dos velhos Novos Baianos continua viva, influenciando jovens artistas e conquistando novos fãs, ninguém duvida.

Recentemente, o clássico "Acabou chorare" foi escolhido o melhor na lista dos cem discos da música brasileira de todos os tempos, segundo votação realizada pela revista "Rolling Stone". Agora, reforçando essa onda, um dos fundadores do grupo — e o primeiro a largar a lendária comunidade musical e cair na estrada para seguir carreira solo —, o cantor, compositor e violonista Moraes Moreira, que completou 60 anos em julho passado, dá a sua versão da epopéia novobaiana num livro em linguagem de cordel, "A história dos Novos Baianos e outros versos", que será lançado hoje no Rio.

Filmes inéditos vão virar DVD Para nostálgicos, agora que dinossauros sacodem a poeira e saem atrás de reforço para suas finanças — dos Mutantes ao Led Zeppelin, do Police às... Spice Girls —, essa seria a hora certa. Mas, escaldado pela frustrante experiência de 1997, quando o grupo lançou "Infinito circular" e fez uma turnê, Moraes descarta a hipótese.

— Para os Novos Baianos existirem, era essencial vivermos juntos, em comunidade, respirando música o tempo todo. Na época (início dos anos 70), quando vinham nos perguntar onde a gente ensaiava, nossa resposta era: "A vida é um ensaio" — relembra ele, que levou cerca de três meses para escrever os 966 versos do cordel.

Novos Baianos, portanto, nunca mais. Mas o livro — lançado pela Língua Geral Editora, acompanhado de um CD no qual o cantor lê o cordel e que traz, na segunda parte, poemas inéditos e letras de sua fase solo — reforça o mito. É também o primeiro passo para a recuperação da obra do grupo. Os principais discos ganharam nos últimos anos versões em CD, e, agora, Moraes acena com raridades: o lançamento de registros em cinema e vídeo do grupo. Até o momento, são quatro DVDs na fila.

— Em 1972, quando a gente vivia no sítio Cantinho do Vovô (na Estrada dos Bandeirantes, Zona Oeste do Rio), Solano Ribeiro ofereceu para uma emissora de TV alemã o projeto de um documentário sobre o grupo. Ele filmou nosso cotidiano, a gente fazendo música, jogando bola, cuidando das crianças. Isso só foi exibido lá, na época, com legendas em alemão — conta Moraes, que já tem a cópia em DVD.

Desse mesmo período há dois outros raros registros. Um, mais musical, é a participação deles no programa "Ensaio", que Fernando Faro dirigiu para a TV Cultura, com clássicos como "Acabou chorare", "Preta, pretinha" e "Dê um rolê". O outro é um íntimo documentário, feito também no sítio-comunidade, pelo fotógrafo Pedro de Moraes (filho de Vinicius). Por fim, o cineasta baiano Henrique Dantas fez agora o documentário "Filhos de João" (João que, claro, é o Gilberto), com cenas de arquivos e entrevistas com os músicos do grupo e gente ligada a eles, como o designer tropicalista Rogério Duarte e o cantor e compositor Tom Zé.

Tom Zé, como é narrado no cordel, foi quem apresentou, em 1968, o jovem Antônio Carlos Moreira Pires, recém-chegado de Ituaçu, no interior da Bahia, ao seu futuro letrista, (Luiz Dias) Galvão — este, nascido em Juazeiro, também a terra de João Gilberto. A partir daí, são introduzidos cada novo novobaiano: Paulinho Boca de Cantor, Baby Consuelo, os irmãos Pepeu e Jorginho Gomes, Dadi Carvalho, Charles Negrita, Baixinho e Bolacha — os dois últimos, já mortos.

Antes e depois de João Gilberto Eles estrearam em Salvador, em 1969, com o show "Desembarque dos bichos e depois do dilúvio".

Um ano depois, desembarcaram em disco com "É ferro na boneca", soando como órfãos roqueiros do tropicalismo. Mas só a partir do segundo, "Acabou chorare", lançado em 1972, que o mito em torno do grupo iria se justificar. Ali nasce uma simbiótica fusão de samba, choro e rock. Para isso foi fundamental o hilariante encontro com João Gilberto. Certa noite, toca a campainha no apartamento em Botafogo (antes de a comunidade se mudar para o sítio), e o baixista Dadi (depois um dos fundadores da Cor do Som e hoje no grupo de Marisa Monte) se assusta com o senhor em roupas formais na porta.Parecia um policial, só que, no lugar de uma intimação, o pai da bossa nova apresentou-os a velhos e então esquecidos sambas.

— João foi quem nos disse para olharmos para dentro da gente.

Graças a ele descobrimos um sem sil que, então, não nos interessava — conta Moraes, que vê na guitarra de Pepeu Gomes a junção de Jacob do Bandolim e Jimi Hendrix.

O terceiro disco, "Novos Baianos F.C." (1973), é outro clássico. O compositor ainda participaria do seguinte, "Novos Baianos (Linguagem do alunte)", em 1974, antes de partir para a carreira solo. Sem, no entanto, cortar de vez o cordão.

— Desde então, a gente vê ciclos de interesse pelos Novos Baianos.

E o atual é muito forte — diz ele, tendo como exemplo mais explícito os Tribalistas Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown.

— E, como a garotada vive me perguntando sobre o grupo, resolvi contar essa história.

A opção pela linguagem do cordel é outro elo com a infância: — Meu irmão mais velho, Zé Walter, é poeta. Lá em casa, fazíamos festivais de poesia, líamos Drummond, Manuel Bandeira. E o cordel é uma arte, com uma estrutura rígida. Se você chegar no Nordeste com um verso capenga, vai ouvir: "Isso não é cordel!".

A experiência picou o músico, que já planeja novo livro — "Dessa vez em prosa, inspirado no interior baiano, que tem algo de ‘Cem anos de solidão’". Mas sem largar a música.

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